terça-feira, 30 de março de 2010

Doces Nuvens

Passos de algodão doce... Leu esta frase em um blog e gostou. Ficou pensando no que seriam exatamente “passos de algodão doce”. Certamente passos suaves, sem alardes. Mas prendeu-se mesmo nas lembranças que esta frase lhe trouxe. A longínqua infância. Dia de sábado. O carrinho do algodão doce estacionado na rua sem saída. Sem saída para os adultos, mas para a criançada nada impedia a passagem para o lado de lá da rua. Bastavam duas buzinadas para a criançada correr, estivessem onde estivessem, e rodearem o carrinho. O moço do algodão doce pedia fila. Que fila que nada. Todos queriam o primeiro lugar. Gostava de ver aquele açúcar virar-se em finos fios brancos. Os pequenos fios iam parar no papel que o doceiro segurava e ali ia formando como que linda nuvem, branquinha, branquinha . Gulosos olhos. Moedas muitas vezes parcas. Nem sempre podia encher a boca daquela guloseima deliciosa. Aos poucos a meninada esparramava-se pela rua, lambuzando-se daquela nuvem docinha, que como mágica, sumiam dentro da boca. E sua boca enchia-se de vontade de engolir aquela nuvem, mas nem sempre ela podia... nem sempre...

terça-feira, 16 de março de 2010

INDIFERENÇA

Era madrugada quando desligou os botões que apagam luzes e trazem silêncio. Sempre foi a última a recolher-se. Sobravam-lhe algumas tarefas que automaticamente fazia, mas naquela noite as coisas foram diferentes. Ao levantar-se da cadeira sentiu leve tontura. Estranhou, mas não se incomodou. Ganhou as escadas e a quente água que saia do chuveiro. Perfumou-se. Hábito antigo. Em tempos de aperto ficou sem seus perfumes e se aborreceu. Delicadamente ajeitou-se na cama. Não queria incomodar. A última luz apagou-se. A de seu celular. Outra mania que adquiriu recentemente. Gosta de ler as mensagens do dia, do dia anterior, de outros dias. Não apaga nenhuma. Faz disso sua oração. Novamente a tontura. Sensação ruim. O suor brotando pelos poros. Sentiu calor. Ajeitou-se novamente e tentou dormir. Tontura novamente. Desta vez pra valer. Não conseguiu chamar. O corpo deslizando... indo... Confusão mental. Sentiu medo, calafrios e arrepios. Como era possível não ter forças para lutar? Estaria morrendo? Em meio ao desespero, um grito. O marido, sonolento e indiferente a tudo pergunta: o que foi? Não vê que estou morrendo? Morrendo? Não vejo nada. Você não está morrendo. Claro que estou. Você é que nunca percebe nada. Alguma coisa está me puxando, me levando e você fica aí me olhando? Você estava sonhando. Eeeeu? Sonhando? É tudo que tem a dizer? Nem consegui dormir e já vem você dizendo, como sempre, que eu estava sonhando? Então durma. Dormir? Acha que posso dormir? Não posso. Como não pode? Se eu dormir, morro. Não to entendendo nada. E daí? Você nunca entende. Fique acordado. Não me deixe dormir. Não me deixe morrer. Você está molhada de suor! Não disse! Alguma coisa está errada. Você está gelada. Porque está chorando? Não sei. Como não sabe? Não sei. Deixou por isso mesmo. Sequer tentou descobrir o motivo das lágrimas. Nem mesmo no dia seguinte ele perguntou. Era como se nada tivesse acontecido. Envolveu-a em seus braços. Puxou o lençol e a cobriu. E dormiu. Ela ficou quieta, aquecida, esquecida. Teve medo de dormir. Lembrou-se de uma mensagem que havia recebido que trazia uma conversa de Emília e o Sr Visconde: "– A vida, senhor Visconde, é um pisca-pisca. A gente nasce, isto é, começa a piscar. Quem pára de piscar chegou ao fim, morreu. Piscar é abrir e fechar os olhos – viver é isso. É um dorme e acorda, dorme e acorda, até que dorme e não acorda mais [...] A vida das gentes neste mundo, senhor Sabugo, é isso. Um rosário de piscados. Cada pisco é um dia. Pisca e mama, pisca e brinca, pisca e estuda, pisca e ama, pisca e cria filhos, pisca e geme os reumatismos, e por fim pisca pela última vez e morre. – E depois que morre?, perguntou o Visconde. – Depois que morre, vira hipótese. É ou não é?" Não. Definitivamente não era o momento para virar hipótese. E não virou.

Texto em negrito: Sítio do Pica-Pau-Amarelo – Monteiro Lobato

quinta-feira, 11 de março de 2010

SAUDADE

Dói?

Dói sim.

Muito?

Muito sim.

Passa?

Passa não.

Tem remédio?

Tem não.

Não tem cura?

Tem não.

E então?

Só matando.

Morre de vez?

De vez não.

Quer dizer que volta?

Volta sim.

E aí?

Mate-a novamente.

domingo, 7 de março de 2010

Pequeno Presente... Grande Confusão

Aceite. Não posso. Orgulho? Ah, não. Não é orgulho não, mas isso não, jamais. Jamais. Sou grato, mas não vou aceitar e não me queira mal por isso. Não quero te aborrecer, mas quero que aceite. Qual é o problema? Princípios. Apenas isso. Nossa relação tem outra natureza, aliás, uma linda natureza. Você me comove e eu fico envaidecido por tudo. Não me faça chorar, hein!!! Você é que me faz chorar. Por favor. Só desta vez, aceite. Não. É um presente. Não posso. Eu é que não posso ficar com isso. Que quer? Que jogue fora? Não dá. Desculpe. Não vou aceitar. Então não posso dar um presente? O que há de errado? Está fazendo com que me sinta pequena. Envergonhada. Só pensei que poderia usar comigo. Quero que aceite. Não insista. Já disse: não! Só desta vez, por favor. Não farei mais isso. Preciso ir. Aonde vai? Ao médico. Já falei das tonteiras. E agora você me deixou pior. Não fique assim. Procure entender. Estou atrasada. Vai aceitar ou não vai? Já disse. É não e pronto. Você é complicado. E você insistente. Eeeeeu! Conseguiu. O que? Fazer-me chorar. Era isso que queria? Fazer de mim uma ameba? O que vai dizer ao médico? Que me receite um veneno. Creduuuuu! Ah, era lilás. O que? Meu vestido. Que vestido? Quantos vestidos meus você conhece? Lilás? Não era azul? E nem meu esmalte era branco. Não? Estava sem os óculos. Acho que estava mesmo sem cor. Desculpe. Nada não. Falei pra te azucrinar. Preciso ir. Não vá. Aceite por favor. Depois nos falamos. ... Voltei. Ufa! Que bom que aceitou. Estou aliviada. E que o médico disse? Nada. Como nada? Não disse a ele que estava com tonturas? Falei nada não. Apenas disse a ele que eu ia morrer. Você falou isso? Sim. Qual o problema? E aí? Ele respondeu que morremos do que vivemos. Compreendi minha morte. É? Diga, vai morrer de que? Ora, se morremos do que vivemos então só posso morrer de AMOR.